Muita gente foi pega de surpresa nas últimas semanas com o anúncio da parceria de desenvolvimento para novos produtos entre a General Motors (responsável pela Chevrolet) e o grupo coreano Hyundai-Kia. A “união”, segundo as empresas, dará origem a uma série de novos compactos para ambas, com foco especial na América Latina.
Em particular, a nova aliança deve render duas picapes inéditas para a Hyundai. A primeira terá porte intermediário, provavelmente uma interpretação da Chevrolet Montana. A segunda será uma média, que deverá nascer com base na S10. Além delas, o comunicado mencionava ainda novos hatches e SUVs compactos. No total, as duas estimam produzir cerca de 800 mil carros por ano quando tudo estiver pronto. Em outras palavras, serão veículos de volume.
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Fonte: Thomas Tironi
O anúncio, entretanto, não é exatamente uma novidade no setor automotivo, principalmente para a General Motors. Trocas entre montadoras são mais comuns do que a maioria imagina, seja no desenvolvimento, no compartilhamento de peças, na motorização ou até mesmo em modelos completos. O exemplo mais conhecido no Brasil foi a Autolatina, que uniu Ford e Volkswagen durante o fim dos anos 1980 e meados da década de 1990.
Uma parceria menos lembrada é a do grupo GM com a japonesa Suzuki. A marca chegou a vender modelos da estadunidense no Japão, enquanto na América do Norte vários Suzuki foram comercializados como Chevrolet e Geo, voltados ao público jovem. Era a estratégia para disputar espaço com rivais como Toyota RAV4 e Corolla.

Foto de: Thomas Tironi

Foto de: Thomas Tironi
Essa relação só foi possível porque as duas iniciaram uma parceria global nos anos 1980, quando a GM comprou cerca de 5% de participação acionária na Suzuki. Na década seguinte, a participação dobrou. Em 2001, já passava de 20% e durou até meados da década. Depois da crise econômica de 2008, a própria Suzuki começou a recomprar as ações que estavam com a General Motors. Processo que foi concluído em 2011.
Na América do Sul, essa parceria rendeu alguns produtos curiosos. Um deles foi o Suzuki Fun, vendido na Argentina e cuja história já contamos por aqui. Outro foi a fabricação e venda do Chevrolet Tracker de primeira geração, lançado em 2001.

Para vender Tracker como Chevrolet, Suzuki pediu Celta com logo da japonesa na Argentina
Foto de: Suzuki
Diferente das segunda e terceira gerações, provavelmente as mais lembradas quando se fala no SUV, a primeira tinha uma proposta bem distinta. Oferecida por cerca de oito anos, apostava em tração 4×4, contava com opção de motorização a diesel e tinha receita de modelos maiores.
O preço, contudo, era alto. No ano de lançamento, chegou ao mercado em versão única por R$ 61.900. Era menos do que um Toyota RAV4 (R$ 66.800) ou um Honda CR-V (R$ 66.532), mas ainda representava um valor alto em uma época de salário mínimo de apenas R$ 180.

Foto de: Thomas Tironi

Foto de: Thomas Tironi
Era bem recheado no pacote de equipamentos. Trazia ar-condicionado manual, direção assistida, duas bolsas infláveis, freios ABS, comandos elétricos para vidros, travas e retrovisores, rádio com toca-CD, rodas de liga leve de 16″ e teto solar elétrico. O ponto negativo ficava por conta da ausência do câmbio automático, já presente nos concorrentes e até no seu gêmeo da Suzuki, o Grand Vitara, que foi oferecido ao mesmo tempo no Brasil.

Interior do Tracker nem sequer ganhou logo da marca americana
Foto de: Thomas Tironi
Falando no Vitara, as diferenças visuais entre os dois eram mínimas e quase imperceptíveis para quem não observasse de perto. Basicamente, se limitavam à grade dianteira, que trazia a gravatinha da Chevrolet, e aos para-choques pintados na cor da carroceria. No restante, eram praticamente idênticos, o que reforçava a impressão de que o Tracker era, na verdade, apenas um Suzuki rebatizado.
Esse detalhe fazia o SUV destoar bastante da linha de produtos oferecidos pela Chevrolet naquele momento. Vale lembrar que, nos anos 2000, a gama da marca no Brasil ainda era fortemente baseada em modelos de origem Opel, oferecendo o compacto Corsa, o médio Astra e o médio-grande Vectra. Em meio a esse conjunto de carros urbanos e familiares, o Tracker parecia um corpo estranho, mais caro e mais rústico do que o público da marca estava acostumado.

Modelo destoava de outros Chevrolet de origem Opel, como Astra
Foto de: Thomas Tironi
Na motorização, o SUV chegou equipado com um 2.0 turbodiesel produzido no Japão pela Mazda, que entregava modestos 87 cv de potência. O desempenho era fraco, a ponto de levar mais tempo para acelerar de 0 a 100 km/h do que alguns modelos 1.0 da época. Um ano depois, o motor Mazda foi substituído por um de origem Peugeot, o que deu novo fôlego ao Tracker.
A potência subiu em 21 cv, o que permitiu ao SUV alcançar números mais competitivos em aceleração e velocidade máxima. O tempo de 0 a 100 km/h caiu de intermináveis 21 segundos para 13, enquanto a velocidade máxima passou de pouco mais de 140 km/h para 163 km/h. Ainda assim, não era suficiente para colocá-lo como referência frente aos rivais.

Tracker tentava bater Pajero TR4, mas patinava no preço alto e volume escasso
Foto de: Thomas Tironi
Após um breve período fora do mercado brasileiro, motivado pela alta do dólar e pelas baixas vendas, o SUV retornou entre 2006 e 2007 com uma nova motorização a gasolina. Essa atualização o deixava melhor preparado para enfrentar concorrentes como o Mitsubishi Pajero TR4.
A mudança, entretanto, não foi suficiente para mudar a realidade do SUV. O Tracker continuava sendo uma presença rara nas ruas brasileiras. Os volumes que chegavam ao país eram baixos, as vendas sofriam frequentes oscilações e o modelo nunca conseguiu se firmar como uma opção de grande apelo comercial. O resultado foi o encerramento definitivo de sua trajetória no Brasil em 2009.

Chevrolet Tracker de segunda geração mudou de proposta e virou mais urbano
Foto de: Thomas Tironi
A partir daí, a parceria entre as GM e Suzuki esfriou cada vez mais, dando fim ainda ao Celta ”japonês” na Argentina. Com o fim do primeiro Tracker, a Chevrolet só teria um novo SUV compacto com a chegada da segunda encarnação do modelo, em 2013, agora um modelo derivado do Sonic, e somente com tração 4×2. A atual geração, baseada no Onix, é oferecida desde 2020 e acaba de receber a primeira reestilização mais pesada para a linha 2026.