A indústria automotiva global volta a enfrentar o fantasma da escassez de semicondutores. A Associação Europeia dos Fabricantes de Automóveis (ACEA) alertou que as primeiras paralisações em linhas de montagem podem começar nos próximos dias, reacendendo o temor de uma nova crise semelhante à que afetou o setor durante a pandemia de Covid-19.
Em comunicado divulgado na quarta-feira, 29/10, a diretora-geral da entidade, Sigrid de Vries, afirmou que o cenário é crítico e que “faltam apenas alguns dias” para que a falta de componentes chegue às fábricas. Ela pediu “urgência de todas as partes envolvidas para redobrar os esforços em busca de uma solução”. Segundo De Vries, o problema desta vez tem origem política, e não apenas produtiva. As informações são do The Guardian.

Crise da Nexperia: entenda o caso
Em setembro de 2025, o governo holandês assumiu o controle da Nexperia, fabricante de semicondutores de capital chinês, ao invocar a Lei de Disponibilidade de Bens, criada na época da Guerra Fria. A medida foi justificada por preocupações de segurança nacional e pela alegação de “sérias falhas de governança” dentro da empresa, sob o temor de que tecnologia crítica fosse transferida à Wingtech, sua controladora chinesa.
A decisão veio após a Wingtech ser incluída em uma lista de restrições de exportação dos Estados Unidos, o que agravou o impasse diplomático. Em resposta, o governo chinês bloqueou as exportações de produtos acabados das fábricas da Nexperia localizadas em seu território, interrompendo o fornecimento global de chips automotivos.

A sede da Nexperia em Nijmegen, na Holanda
Foto de: Divulgação
Segundo a Reuters, a crise se intensificou quando a subsidiária chinesa da Nexperia declarou independência administrativa da matriz holandesa e passou a vender seus produtos apenas para o mercado interno. O resultado foi imediato: montadoras europeias ficaram sem acesso a uma parte vital do suprimento de semicondutores simples usados em módulos eletrônicos, sensores e sistemas de controle.
Entre as mais afetadas estão Volkswagen, Volvo e Stellantis, que já relatam estoques reduzidos e avaliam paradas parciais nas próximas semanas. A Volkswagen informou que tem chips suficientes para manter as operações por apenas uma semana, enquanto a Bosch alertou que pode suspender temporariamente as operações na Alemanha, o que levaria a afastamentos de funcionários e atrasos em entregas.

Foto de: Motor1 Argentina
A ACEA afirma que existem fornecedores alternativos, mas que o aumento de capacidade levará meses. Analistas estimam que, se o bloqueio chinês persistir, até 20% da produção automotiva mundial poderá ser impactada até o fim do ano.
Nos Estados Unidos, a Automotive News relatou que fábricas da Honda já começaram a registrar interrupções pontuais por falta de semicondutores. Especialistas avaliam que o cenário atual pode desencadear uma nova crise global de abastecimento — agora movida mais por tensões geopolíticas do que por gargalos produtivos.

Brasil articula para escapar da crise
O governo federal abriu diálogo com o governo chinês para tentar retirar o Brasil do embargo das exportações dos chips da Nexperia, evitando que o país seja afetado pela escassez. A iniciativa foi discutida na última terça-feira, 28/10, em Brasília, durante reunião entre o presidente interino e ministro do MDIC, Geraldo Alckmin, representantes da Anfavea, do Sindipeças e sindicatos de metalúrgicos.
Segundo Uallace Moreira, secretário de Desenvolvimento Industrial do MDIC, se não houver uma solução rápida, a produção nacional poderá ser interrompida “em duas ou três semanas”. A Nexperia é responsável por cerca de 40% dos chips usados pela indústria automotiva brasileira.

Foto de: Stellantis
“O vice-presidente já telefonou para o embaixador chinês no Brasil e para o embaixador brasileiro em Pequim. A proposta é excluir o País desta crise, de caráter geopolítico, que não tem absolutamente nada a ver com o Brasil”, afirmou Moreira.
O secretário disse que o tema recebeu “prioridade total” de Alckmin, destacando que o setor automotivo representa 20% da indústria de transformação, com 130 mil empregos diretos e 1,3 milhão de indiretos. Em nota, o MDIC informou que o embaixador chinês Zhu Qingqiao se comprometeu a levar a demanda ao governo de Pequim, enquanto o embaixador brasileiro Marcos Galvão buscará diálogo por meio da Cosban (Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação).
Por enquanto, o governo aposta na via diplomática. O setor produtivo propôs que os chips comprados pelas subsidiárias brasileiras sejam usados exclusivamente no mercado interno, evitando triangulações com matrizes europeias e norte-americanas. “A rastreabilidade é fácil de ser feita”, disse Moreira.
A má notícia é que não há um plano B. “Existem poucos países que produzem este tipo de chip, e os contratos são de médio a longo prazo. Você não consegue substituir um fornecedor de um dia para o outro: depende do nanômetro, do tamanho e da função do chip”, explicou o secretário.
Fontes: The Guardian, Autodata e Reuters
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